- 27/08/2012 |
- Claudio
Bernabucci
- Carta Capital
John K. Galbraith, um dos mais importantes
economistas do século XX, pronunciou-se algumas vezes sobre a “imbecilidade dos
capitalistas”. A observação factual da crise sistêmica que o mundo está vivendo,
sem perspectiva de solução equilibrada dentro das regras existentes, levaria a
pensar que a afirmação do economista canadense tivesse fundamento.
No entanto, do ponto de vista das ideias, devemos
reconhecer que, nas últimas décadas, o capitalismo neoliberal teve a capacidade
de exercer uma hegemonia ímpar sobre todas as atividades humanas. Sofisticados
instrumentos teóricos e culturais permitiram a esta nova ideologia eliminar
qualquer resistência e crítica significativas, a ponto de se configurar como um
“pensamento único”. Só recentemente, diante dos graves escândalos no coração do
sistema, este primado começou a ser posto em discussão de forma incisiva.
Já mencionamos a batalha de ideias em curso e a
relação de forças existentes. Vale a pena reiterar que estamos assistindo a uma
autêntica guerra global dentro do sistema capitalista, da qual o neoliberalismo
sairá derrotado ou vencedor. No último caso, podemos estar certos: o que resta
da democracia no planeta estaria seriamente comprometido. Neste quadro, a
circulação das ideias em escala planetária é fundamental para a definição do
resultado. Somente por meio da difusão de pensamentos plurais e antitéticos ao
dominante, poderão ser conquistadas as mentes e os corações habilitados a criar
uma nova civilização para superar as injustiças de um mundo onde minorias não
eleitas decidem o destino de bilhões de seres humanos.
A ferramenta principal é a mídia. A livre difusão
da internet – com a grave exceção da China –, apesar de limitada, permite uma
informação de baixo para cima que tem aberto brechas importantes no monólito do
pensamento único. Os jornais independentes sempre foram minoria e, na chamada
grande imprensa, as vozes autônomas são escassas, relegadas aos espaços de
debates: espécie de reserva indígena-intelectual, que visa demonstrar o
pluralismo de um jornal, enquanto a informação transmitida em todas as outras
páginas defende pura e simplesmente a ordem existente. Mundo afora, o cidadão é
informado sobre a crise econômico-financeira de forma predominantemente
mecanicista, tecnicista e distorcida. As causas principais das convulsões em
curso são eludidas: in primis a desregulamentação insensata do sistema
financeiro, origem de fraudes e falências.
As análises de economistas e jornalistas
alinhados ao neoliberalismo, e que ainda são maioria, chegam de hábito a um beco
sem saída, a um porto das névoas, quando tocam o tema “mercados”. Neste ponto,
as dúvidas desaparecem, as perguntas se extinguem – Ipse dixit! – em obséquio
aos inomináveis e onipotentes titereiros donos dos “mercados”.
Sendo assim, os cortes sociais realizados pelos
governos europeus, alvos de ataques especulativos, são descritos mecanicamente
como respostas obrigatórias, para satisfazer às exigências ou aos humores dos
“mercados”. Obviamente, isso é feito sem informar quais grupos de interesses e
forças concretas estão por trás dos tais “mercados”. As imponentes
transferências de riquezas provocadas pela gangorra dos spreads ou negociatas
das bolsas de valores, a existência de imensas fortunas escondidas nos “paraísos
fiscais”, são fatos descritos de forma fria e tecnicista, incompreensível para o
cidadão comum, oferecendo uma representação da realidade absolutamente
surrealista, sem análise alguma sobre as causas e consequências.
A situação da mídia brasileira cabe perfeitamente
neste quadro, com algum agravante. O “pensamento único” da chamada grande
imprensa é bem mais extenso aqui do que em outros países de democracia madura. A
esse aspecto acrescenta-se um partidarismo acentuado, unilateralmente
antigovernamental, que contrasta com uma concepção da informação como serviço
pluralista à cidadania. O governo brasileiro não pode ser isento de críticas,
mas o mérito de ser um dos poucos no mundo que na última década conseguiram
crescimento econômico e diminuição das desigualdades, deveria ser reconhecido em
homenagem aos fatos.
Em suma, a opinião pública mundial padece de uma
informação parcial ou distorcida, que esconde a realidade de um planeta onde a
desigualdade sem freios e a avidez do lucro estão comprometendo as
possibilidades de construir um futuro comum. Esta “cegueira” é na maioria das
vezes fruto de partidarismo ideológico, que esconde interesses oligárquicos
supranacionais; outras vezes é consequência da incapacidade de sair do esquema
prefixado de pensar e agir. Para reverter esse quadro perigoso, é preciso que se
difunda o pensamento crítico, hoje minoritário. O papel da mídia independente é
de informar sobre os fatos e ideias que os outros não querem ou não podem
contar.
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