- Fabíola Meira de Almeida Santos
- Folha de S. Paulo
A nova política de privacidade do Google permite que
ele monitore até nossas ligações; com medo de não ter mais acesso ao seu
Gmail, o usuário fica sem reação
O deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS) informou no último dia 14 de
fevereiro que vai requerer ao Google que explique, no Congresso, a sua
"nova política de privacidade".
O pedido do parlamentar está em perfeita consonância com as necessidades da sociedade.
No caso do Google, a "nova política de privacidade" foi apresentada
como um avanço no sentido de ampliar a transparência sobre os serviços
do buscador. No entanto, a nova política visa apenas deixar claro que o
usuário será totalmente monitorado pelo próprio Google.
Apesar de o Google partir do princípio de que o usuário concorda com o
armazenamento de dados para fins de recebimento de resultados
personalizados nas pesquisas, creio que a maioria dos internautas
gostaria de utilizar a rede mundial sem uma "câmera embutida" em seu
computador que possa revelar para terceiros o que foi acessado, em que
data e por quanto tempo.
Deseja-se muito menos que o Google crie um perfil de cada usuário,
supostamente para aperfeiçoamento do sistema. Sem escolha, o que ocorre
na prática é a submissão dos usuários às regras impostas
unilateralmente.
O próprio Google informa que coleta informações "para fornecer
serviços melhores a todos nossos usuários" e que "pode coletar
informações específicas do dispositivo (como seu modelo de hardware,
versão do sistema operacional, identificadores exclusivos de produtos e
informações de rede móvel, inclusive número de telefone)".
O buscador também avisa que poderá coletar "informações de registro
de telefonia, como o número de seu telefone, número de quem chama,
números de encaminhamentos, horário e data de chamadas, duração das
chamadas, informações de identificador de SMS e tipos de chamadas".
O direito à privacidade é uma garantia fundamental, expressa no do
artigo 5º da Constituição ("são invioláveis a intimidade, a vida
privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a
indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação").
Código Civil (artigo 21) e Código de Defesa do Consumidor também não
permitem a nova política do Google.
Ora, se é tão fácil concluir que o uso indevido de imagem constitui
ilicitude, é difícil entender a razão pela qual a utilização indevida de
informações pessoais (ou a proibição de acesso a determinados produtos e
serviços sem que a privacidade seja invadida) não seja vista, até o
momento, como um ato contrário ao direito.
Na Espanha, o problema da captura de dados é tão grave que foi criada
a Agência Espanhola de Proteção de Dados, órgão que auxilia o cidadão
na proteção de sua privacidade. Ele disponibiliza formulários e auxílio
para aqueles que querem ter acesso a um serviço essencial, a internet,
sem que a sua privacidade seja violada.
É impossível para o usuário monitorar o buscador para saber se a suas
informações detalhadas não estejam sendo utilizadas para finalidades
que não sejam a declarada.
Pode-se afirmar que o usuário concordou com a "nova política de
privacidade". Será que ele concordou mesmo ou ele se viu acuado por
saber que, se não aceitasse as regras, perderia, por exemplo, o acesso
ao seu Gmail e, assim, a todos os seus contatos e informações?
Exigir que o consumidor aceite as regras invasivas para ter acesso ao produto ou serviço é prática comercial abusiva.
Admitindo-se um verdadeiro "vale-tudo" na internet, nos
transformaremos, em pouco tempo, em uma sociedade que se desenvolverá
com mentes manipuladas e sem a mínima liberdade de escolha. Uma
sociedade monitorada jamais será uma sociedade livre.
* 33, mestre em direito, é advogada e professora da PUC-SP
Nenhum comentário:
Postar um comentário